Hoje, a tecnologia QR Code mais usada para esse tipo de pagamento é a NFC (Near Field Communication), e é usada não apenas nos cartões de crédito que funcionam por aproximação mas também em soluções como Apple Pay.
Em 2019, estamos vendo cada vez mais pessoas usando pagamentos por aproximação – uma facilidade que nos faz sentir que estamos mesmo mais próximos daquele futuro imaginado pelos filmes de ficção científica. Afinal, é muito coisa de filme você apenas aproximar o seu cartão/aparelho celular de uma maquininha e o pagamento já ser processado, sem a necessidade de se inserir senhas.
Hoje, a tecnologia mais usada para esse tipo de pagamento é a NFC (Near Field Communication, ou comunicação em campo por aproximação em tradução livre), e é usada não apenas nos cartões de crédito que funcionam por aproximação mas também em soluções como o Apple Pay.
Ainda que muita gente tenha receio sobre essa tecnologia, a realidade é que ela é muito mais segura do que o pagamento tradicional com cartão. Isso porque, apesar de não exigir a digitação de uma senha para efetuar o pagamento, as informações trocadas entre a maquininha que receberá o pagamento e o dispositivo que contém suas informações bancárias (seja o cartão de crédito ou o celular) são totalmente criptografadas. Isso permite que, mesmo que a máquina tenha sido “hackeada” por algum criminoso, ele terá ainda que conseguir desencriptar suas informações de pagamento para ter acesso a elas – um novo nível de segurança que não existe no pagamento mais tradicional, com o qual ele teria acesso direto à senha do seu cartão, já que as informações já digitadas na maquininha só são criptografadas quando enviadas para o servidor de cartões, e não durante a inserção.
Mesmo com todas as vantagens, o NFC não deve se tornar o principal meio de pagamento por aproximação no Brasil por diversos motivos. Primeiro, porque criar um cartão com essa tecnologia é relativamente caro (custo de R$ 15 e R$ 20 por unidade) o que por si só já garante que a mudança seria muito lenta, pois obrigaria os bancos e outras operadoras de cartão a ir trocando aos poucos suas bases. Isso porque uma troca em massa exigiria um investimento de algumas dezenas de milhões – ou até mesmo bilhões para as maiores instituições financeiras do país.
Outro fator que “joga contra” o NFC é a dificuldade de se popularizar seu processo. Hoje, o Brasil possui cerca de 60 milhões de adultos consumidores que não possuem conta em banco – ou seja, não possuem cartão e fazem todas as suas compras pagando no dinheiro ou por boleto, que pode se pago em espécie nas casas lotéricas. Para completar, essa tecnologia está presente apenas nos modelos mais avançados dos telefones celulares – aqueles que costumam custar mais de R$3.000 – o que impede que este meio,realmente, se torne um tipo de pagamento democrático.
Mas isso não quer dizer que os pagamentos com proximidade estejam fadados a não funcionar no Brasil; especialistas acreditam que esse tipo de pagamento será mesmo o futuro do país, mas com uma outra tecnologia: o QR Code
A hora e vez do QR Code
Para que ocorra uma verdadeira “revolução” dos pagamentos por proximidade no Brasil, a aposta para o país é o uso do QR Code, uma tecnologia muito mais simples e democrática – mas que não perde em nada no quesito de facilidade e segurança.
E umas das pessoas que acreditam que o QR Code pode ser mesmo a melhor solução de pagamentos para o futuro do mercado brasileiro é Alexandre Pinto, diretor de novos negócios da Matera – uma empresa especializada em desenvolver tecnologias para o mercado financeiro, varejo e de gestão de riscos. Em entrevista para o Canaltech, Pinto fala sobre algumas das vantagens que a tecnologia possui sobre o NFC quando pensamos no mercado local.
A primeira delas seria o custo operacional: desenvolver um sistema de QR Code é muito mais barato do que um por NFC. Isso porque não é necessário trocar todo o sistema de cartões de um banco ou instituição financeira; tudo o que ele necessita é a criação de um app que gere esses QR Codes e pronto, tudo resolvido. Tanto é que algumas empresas de vendas pela internet, como o iFood, a Rappi e a Americanas.com já utilizam esse recurso como uma de suas opções de pagamentos. E, como ele não exige um hardware específico, poderia ser usado tanto nos pagamentos online, quanto em lojas físicas sem nenhum impedimento ou complicação para os lojistas.
Outra vantagem do QR Code seria a facilidade de uso dessa tecnologia. Ao contrário da NFC, que exige que se tenha um cartão (o que significa possuir uma conta em banco) ou um smartphone de última geração, ele pode ser usado por qualquer pessoa que possua um celular com câmera, independente da qualidade do aparelho.
Apesar de milhões de consumidores ainda não possuírem contas em banco, as últimas pesquisas mostram que praticamente toda a população adulta do Brasil possui, hoje, um celular. Logo, uma mudança dos pagamentos para QR Code poderia revolucionar todo o mercado brasileiro, pois esse tipo de código poderia ser facilmente utilizado não apenas para compras em lojas, mas também em sistemas de transportes público (metrô, ônibus, trem, etc), substituindo os atuais bilhetes eletrônicos e até aumentando a segurança desse tipo de acesso, pois um pagamento que pudesse ser feito até pelo celular mais básico significaria que não seria mais necessário existir a possibilidade do pagamento em dinheiro nesses locais.
Revolução bancária
Chamar a mudança para um pagamento via QR Code de “revolução” não é um exagero, pois a adoção da tecnologia realmente iria mudar todo o cenário financeiro nacional.
Isso porque o sistema de pagamentos de QR Code utiliza as chamadas “carteiras digitais” – sistemas como o do PayPal ou do Mercado Livre, que permitem que seus usuários acumulem créditos baseados em moeda real em um único lugar. Por enquanto, essas carteiras são usadas apenas para compras pela internet, mas caso o QR Code se torne um tipo de pagamento comum para todos os lugares, essas carteiras poderão ser usadas também para efetuar compras em los físicas – e é aí que a verdadeira “revolução” do sistema financeiro deverá acontecer.
Isso porque, ao contrário das contas bancárias tradicionais, qualquer pessoa pode criar sua carteira virtual sem nenhuma burocracia, já que elas não exigem o pagamento de nenhum tipo de taxa de manutenção de seus donos e cobram apenas alguns centavos, e não uma porcentagem do valor, para efetuar a transferência entre diferentes carteiras. Assim, caso esses sistemas possam ser usados não apenas para pagamentos virtuais, mas para qualquer tipo de pagamento, as pessoas poderão utilizá-los como suas próprias contas bancárias, permitindo não apenas que elas tenham mais liberdade nas movimentações, sem precisar pagar diversas taxas para que um banco as opere, como ainda democratizará o acesso para que até mesmo consumidores que não possuem holerite ou comprovante de endereço possam abrir suas contas.
Uma mudança para o sistema de QR Code também seria muito boa para os lojistas em si, pois diminuiria em muito os problemas que eles enfrentam para operar com o pagamento via cartão. Hoje, as companhias de cartão cobram em torno de 1,5% a 3% de taxa administrativa dos lojistas para pagamentos no débito. Além disso, eles demoram cerca de 30 dias para depositar esse dinheiro na conta dos lojistas. Já com um sistema de pagamentos todo baseado em carteira virtual, as taxas cobradas para se efetuar uma operação são muito menores – normalmente não ultrapassam 0,5%do valor da transação – e o dinheiro já cai na conta da loja no ato da aprovação do pagamento.
Assim, fica claro que essa mudança seria algo positivo para o público em geral, comerciantes e alguns tipos de bancos – principalmente os menores e os totalmente digitais, que se tornariam mais competitivos contra as maiores instituições bancárias do país. Mas Pinto lembra que nem todos vêem a mudança para a carteira digital com bons olhos, principalmente quando falamos de empresas cujo ramo de operação é mediar a transação de pagamentos, como Cielo e Redecard. Essas empresas poderiam rapidamente deixar de existir com a adoção das carteiras digitais e do pagamento por QR Code, e apenas a perspectiva de mudança já está causando problemas para as financeiras mais tradicionais. Por exemplo, a Cielo tem apresentado queda no valor de suas ações e o Itaú já abandonou completamente o seu modelo de pagamentos tradicional e está pronto para implementar o ITI, que é uma espécie de carteira virtual vinculada ao próprio banco.
Mudança de cultura
Para Pinto, essa mudança de todo um sistema de cobranças só é possível pelo fato do Brasil ser um dos países com regulamentação financeira mais avançadas do mundo – inclusive à frente de nações de primeiro mundo, como os Estados Unidos. Mas o grande desafio para que a revolução aconteça está atualmente nas mãos do Banco Central, que precisa definir uma padronização do sistema de pagamentos QR Code para que ele, realmente, avance com força no país.
Essa padronização é necessária porque, hoje, cada empresa pode criar o seu próprio QR Code do jeito que quiser, o que acaba fazendo com que cada um utilize um código de programação próprio, que só é reconhecido pelo app da respectiva empresa. Com a padronização do sistema, todas as companhias deverão utilizar o mesmo algoritmo para a geração do QR Code, o que permite que qualquer pessoa que tenha um celular baixe apenas um único app e consiga utilizá-lo para fazer pagamentos em qualquer lugar.
A estimativa do Banco Central é que essa padronização esteja finalizada até 2020 – um prazo que Pinto considera como bastante otimista, devido a complexidade do assunto. Mas, mesmo que a previsão não se confirme, o especialista acredita que não irá demorar muito para que o Brasil “vire a chave” e adote o novo padrão de pagamento, já que, segundo ele, “somos um país de mudança rápida de cultura”.
O executivo, claro, admite que tudo não irá acontecer como um “passe de mágica”: será necessário fazer um belo trabalho de marketing sobre as vantagens do uso do QR Code e, provavelmente, oferecer benefícios como cashback, para que as pessoas percam o receio e comecem a experimentar a nova forma de pagamento. Mas, depois que isso acontecer, ele acredita que as vantagens da carteira digital são tão grandes – tanto para o consumidor quanto para os comerciantes – que em questão de poucos anos o uso de cartões estará praticamente extinto.
Mesmo que existam muitas variáveis que precisam se alinhar para que o pagamento por QR Code se torne o grande próximo passo do nosso sistema financeiro, a possibilidade está aí, muito mais próxima do que imaginamos. E, se acontecer, será a próxima grande revolução de nosso sistema bancário desde a invenção do cartão de crédito.