Em três semanas de campanha, os políticos apostaram na compra de palavras-chaves no Google e de anúncios no YouTube.
Quatro anos após a eleição marcada pela influência das redes sociais e dos grupos de WhatsApp usados para propagação de fake news, a disputa de 2022 tem registrado investimento massivo das campanhas em plataformas digitais, principalmente para defesa dos candidatos.
Em três semanas de campanha, os políticos apostaram na compra de palavras-chaves no Google e de anúncios no YouTube para mitigar arranhões na imagem e se desvencilhar de acusações de adversários.
Respectivamente primeiro e segundo colocados nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) foram os que mais investiram nessas ações. O petista gastou mais de R$ 2 milhões em propagandas nas plataformas, e o atual presidente, quase R$ 1 milhão com anúncios segmentados para públicos específicos.
Neles, os candidatos conseguem definir qual o perfil —por região, gênero e idade— que irá receber o resultado no buscador e visualizar a propaganda do YouTube. No caso do Google, é oferecido o primeiro lugar no resultado de busca para uma determinada palavra-chave.
Com isso, equipes dos partidos têm monitorado os assuntos mais buscados e comentados em relação ao seu candidato e aos adversários e tentado responder com anúncios de links ou vídeos. Nas campanhas, a estratégia recebeu apelidos como “vacina” e “defesa”.
O movimento para mitigar danos foi adotado pela equipe do presidente da República na última semana, após o debate presidencial, quando ele atacou a jornalista Vera Magalhães e a candidata Simone Tebet (MDB).
Enquanto via um movimento de buscas aumentar com as palavras-chaves “machismo” e “ataques” relacionadas ao candidato à reeleição, sua campanha pagou para que dois vídeos aparecessem nas buscas e fossem exibidos na internet.
As peças de propaganda também foram veiculadas no horário eleitoral na televisão aberta. Num vídeo de 30 segundos, a primeira-dama Michelle Bolsonaro fala sobre a chegada da água no sertão.
“Um presente para a mulher que merece e deve ser o que ele quiser. Juntas, estamos construindo um Brasil para elas, com elas e por elas”, conclui a esposa do presidente.
Outra propaganda mostra cenas de um jogo de futebol em que a bola é uma reprodução da cabeça de Bolsonaro e de ataques e críticas a ele. “Qual o limite de agressões um homem pode suportar?”, indaga uma locutora mulher.
Nas duas ações, os bolsonaristas gastaram cerca de R$ 80 mil e alcançaram mais de 10 milhões de visualizações só nos meios digitais, sem contar o público impactado na televisão aberta.
O eleitorado feminino representa um calcanhar de Aquiles na popularidade do presidente. Ele acumula um histórico de ataques a mulheres, declarações misóginas e machistas.
Na pesquisa Datafolha divulgada na quinta (1º), 35% dos homens diziam votar no candidato à reeleição em resposta espontânea. O índice caía para 24% entre elas. Os números variam menos entre os eleitores de Lula: 39% do eleitorado masculino declararam voto no petista na pesquisa espontânea, contra 41% do feminino.
A rejeição de Bolsonaro é mais discrepante: 55% das mulheres dizem não votar de jeito nenhum no atual presidente, índice que cai para 35% quando se fala do petista.
Nas últimas semanas, Lula teve pelo menos duas ações de reparação de danos orquestradas com compras de palavras-chaves no buscador e vídeos na plataforma do Google.
Na primeira, revelada pela Folha no dia 29 de agosto, o PT gastou mais de R$ 100 mil em anúncios no YouTube e no Google com defesas do ex-presidente em temas relacionados à corrupção.
Na plataforma de vídeos, a campanha comprou espaço para veicular um trecho da sabatina do Jornal Nacional. A edição mostrava a abertura da entrevista em que William Bonner afirmou que o petista não deve nada à Justiça. Foi cortada a pergunta do apresentador, que citava casos de corrupção. Após solicitação da Globo, a campanha retirou o vídeo do ar.
A equipe do PT também fez anúncios no Google para que o link de um texto da página oficial do ex-presidente aparecesse como primeiro resultado de buscas para termos como “Lula ladrão” e “Lula corrupto”, que tiveram picos de procura no dia 26 de agosto, data da entrevista no Jornal Nacional, e domingo (28), quando houve o debate.
Na terça (30), os petistas usaram a ação de defesa na internet para reagir a um ataque que Ciro Gomes (PDT) havia feito um dia antes nas redes sociais.
O terceiro colocado nas pesquisas de intenção de voto postou na sua conta oficial no Twitter uma foto de Lula e escreveu que o petista está “cada dia mais fraco, fisicamente, psicologicamente e teoricamente (sic), para enfrentar a direita sanguinária”. Horas depois, ele apagou a postagem.
Seguido ao ataque, houve um aumento nas buscas com perguntas questionando a saúde de Lula. Os petistas, então, pagaram para que uma propaganda destinada ao público na faixa etária de 18 a até 54 anos fosse veiculada no YouTube.
No vídeo, aparecem imagens do ex-presidente de short e camisa regata, rindo e fazendo musculação. O áudio é de um discurso em que ele afirma estar “com uma energia de 30 anos e a motivação e o tesão de brigar por esse país”.
“Para um país forte, é Lula presidente”, conclui uma locutora.
A compra de palavras-chaves no buscador e de anúncios na plataforma de vídeo do Google é permitida pela legislação eleitoral desde 2017.
“É algo incipiente, relativamente novo no Brasil e com um resultado muito eficiente”, afirma Arthur Ituassu, professor de comunicação política da PUC-Rio e pesquisador associado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital.
Ituassu destaca que, nas buscas, o político consegue segmentar o público impactado e ir além da “bolha” que já o acompanha nas redes sociais.
Antes de ser permitida no Brasil, a compra de palavras-chaves foi utilizada na política dos Estados Unidos, principalmente a partir das campanhas vencidas pelo ex-presidente Barack Obama em 2008 e em 2012.
Na primeira vitória, o ex-presidente comprou termos relacionadas a saúde, educação e outros temas para garantir melhor ranqueamento no Google e atingir um público que não acompanhava o noticiário político e não participava da eleição nos EUA, onde o voto não é obrigatório.
GASTO DAS CAMPANHAS EM ANÚNCIOS NO GOOGLE
- Lula – R$ 2 milhões
- Bolsonaro – R$ 970 mil
- Tebet – R$ 380 mil
- Ciro – R$ 250 mil
Fonte: Google